Jorge Mineiro
Parece um daqueles gentlemen ingleses, de bigode revirado como nos romances do século XVIII. Mas não: o professor Jorge Mineiro é um cavalheiro cem por cento português. Alto e altivo, é despachado na conversa e nas avaliações. É também um dos melhores cirurgiões do país. Foi ele quem operou a Gabriela à escoliose (a perversa e enorme curva em s na coluna) que a atormentava. E foi ele, para mal dos meus pecados, quem a diagnosticou numa consulta à qual faltei por ter uma reportagem.
Foi nessa malfadada conversa que o Jorge Mineiro falou à
Gabriela em operações ou no colete ortopédico ou em ambos. Escolhi o colete
que-mais-parecia-de-forças apesar de a curva da Gabriela ser nessa altura
demasiado grande para funcionar. E ela recusou-se, anunciou certo dia lavada em
lágrimas, vinda da psicóloga que lhe tinha dado coragem para o fazer, a usar o
aparelho em cujas fitas tinha escrito “Bent, not broken”. Mas isso foi há muito
tempo.
No ano seguinte ao da morte da minha mãe, aquele em que o Jorge
Mineiro me disse para não ficar triste com a decisão da minha filha porque elas
também nos dão tantas alegrias. Ele, pai de três mulheres creio eu, sabe-o bem.
O Jorge Mineiro tem um currículo invejável. Tem também uma
extraordinária capacidade para comunicar com os adolescentes com escoliose, a
quem se dirige directamente. É à Gabriela que ele sempre interpela quando vamos
às consultas e é a ela que quer ouvir.
O Jorge Mineiro ajudou a minha filha a voltar a sorrir. Elogia-lhe
a coragem. E ficou tão feliz no final da cirurgia de três horas como se tivesse
sido ele a ser operado. E isso é bonito e raro de se ver. Ainda por cima, é do
Tramagal, essa freguesia perto de Abrantes de onde vieram tantos amigos meus.



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